A Economia Brasileira Entre o Impasse e a Ilusão: Crescimento Frágil, Rombo nas Estatais e as Armadilhas Para o Próximo Ano
- Alex Lopes

- 4 de dez.
- 9 min de leitura
1. A Estagnação Como Sintoma e Como Estrutura
O desempenho do PIB brasileiro no terceiro trimestre de 2025 — um crescimento irrisório de 0,1% — tornou-se mais do que um número ruim: passou a ser uma metáfora precisa para o momento econômico do país.
Uma economia que avança simbolicamente, mas se equilibra sobre bases frágeis; um governo que insiste em políticas fiscais expansionistas sem contrapartidas claras; um Banco Central que tenta compensar erros estruturais com juros elevados; e um setor produtivo que patina diante de crédito caro, incerteza persistente e ausência de reformas.
Se o Brasil não cresce, não é por falta de oportunidade global — mas por insistência em escolhas equivocadas, por dispersão política e por um Estado que parece ter desaprendido a arte de se administrar.
Este artigo faz uma leitura crítica desse quadro, integra os fatores internos e externos mais recentes — como o rombo recorde nas estatais, o impacto eleitoral de 2026, a guerra tarifária com os Estados Unidos e os efeitos econômicos indiretos da Copa do Mundo — e projeta três cenários para a economia brasileira.
O tom é propositadamente cético: a história econômica recente do país, somada ao ambiente político atual, não dá margem a interpretações benevolentes.
2. A Economia em Marcha Lenta: O PIB Que Parou em Pé
O silêncio eloquente do 0,1%
Um crescimento de 0,1% em um trimestre que deveria apresentar sinais de recuperação indica uma economia exaurida. Serviços perderam tração, a indústria continua sem motores competitivos e a agropecuária apenas compensou parcialmente outros recuos.
O dado é ainda mais grave porque ocorre em um ambiente em que o consumo das famílias está comprimido, a inadimplência segue elevada e o crédito permanece restrito.
O país vive uma espécie de “crescimento zumbi”: tecnicamente vivo, mas sem força vital.
Consumo fraco, investimento frágil
A política monetária restritiva — ainda necessária, dado o desarranjo fiscal do atual governo — tem efeitos claros:
crédito caro reduz consumo,
empresas adiam planos de expansão,
a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) se arrasta,
produtividade estagna e modernização não ocorre.
O Brasil segue preso a um paradoxo que beira o surrealismo econômico: tenta produzir crescimento sustentável operando com juros dignos do Banco Central Europeu em momentos de crise, mas mantendo níveis de produtividade característicos da média latino-americana, frequentemente inferiores aos de países muito mais pobres e com menos recursos naturais.
É como tentar competir numa corrida profissional usando o tênis mais pesado da prova — e ainda esperando alcançar o campeão.
3. O Brasil no Mundo: Não Estamos Sozinhos, Mas Estamos Atrás
OCDE: desaceleração global, mas resiliência relativa
O crescimento médio da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) no 3T25 ficou em torno de 0,2% — número modesto, mas um pouco superior ao brasileiro. Economias desenvolvidas estão desacelerando, mas mantêm tração graças a:
forte investimento em tecnologia,
estabilidade institucional,
e políticas econômicas previsíveis.
O Brasil, por outro lado, com uma política fiscal desastrosa cada vez mais produz desconfiança e crescimentos pífios.
Emergentes asiáticos: onde a política econômica funciona
Enquanto economias do Sudeste Asiático continuam crescendo acima de 3% ao ano — mesmo em desaceleração —, sustentadas por políticas industriais consistentes, o Brasil mantém um modelo híbrido e ineficiente, em que o Estado intervém sem capacidade de gestão e o mercado privado opera sob alto risco regulatório e fiscal.
4. A Política Econômica em 2025: O Paradoxo Brasileiro
Juros elevados: quando o remédio vira combustível do problema
A Selic segue em níveis incompatíveis com crescimento sustentável.
Mas culpar apenas o Banco Central é ignorar o essencial: juros altos são consequência direta da falta de credibilidade fiscal e do aumento persistente do risco-país.
A teoria macroeconômica é clara: quanto maior a incerteza fiscal, maior o prêmio de risco exigido pelo mercado — e mais difícil reduzir juros de forma estrutural.
A política fiscal expansionista e errática
O governo amplia cada vez mais gastos, flexibiliza metas, elevou despesas obrigatórias e sinalizou pouca disposição para reformas estruturais. Na prática:
despesas crescem mais rápido que receitas,
o arcabouço fiscal se tornou uma ficção conveniente,
e a percepção de risco se deteriora continuamente.
A falta de coordenação entre política monetária e fiscal cria um equilíbrio macroeconomicamente tóxico: juros altos + gasto público elevado = estagnação duradoura.
A desconexão entre discurso e prática
O governo fala em “crescimento inclusivo”, “responsabilidade fiscal” e “planejamento”, mas opera estatais deficitárias, amplia programas sem financiamento e ignora a urgência de modernizar o Estado.
5. O Rombo das Estatais Federais: O Estado Como Centro de Custo
Déficit recorde: o retorno do velho problema
Até outubro de 2025, estatais federais (exceto Petrobras, Eletrobras e bancos públicos) registraram déficit de R$ 6,35 bilhões — aproximando-se do pior resultado da série histórica.
Os Correios são o epicentro do problema:
prejuízo superior a R$ 4 bilhões no primeiro semestre,
projeções de até R$ 10 bilhões no ano,
estimativas internas indicando risco de R$ 23 bilhões em déficit até 2026.
Outras estatais, como Eletronuclear, seguem exigindo aportes vultosos.
Por que isso importa para o contribuinte
Pela metodologia do Banco Central — baseada na necessidade de financiamento — todo déficit nas estatais representa exigência direta de recursos do Tesouro.
Ou seja:
mais dívida,
menos espaço para política pública,
mais contingenciamento,
mais pressão fiscal.
Quando se diz que determinado prejuízo “exige recursos do Tesouro”, é fundamental deixar explícito o que isso realmente significa. O Tesouro Nacional não é uma entidade abstrata ou um cofre isolado — ele é, na prática, o caixa formado pelos impostos pagos por todos os brasileiros.
Cada real que entra ali vem do esforço produtivo da sociedade: do consumo tributado, do salário descontado, das empresas taxadas, do crédito onerado.
Portanto, quando o Tesouro é obrigado a cobrir déficits de estatais mal administradas — muitas vezes resultado de ineficiência crônica, ingerência política ou mesmo desvios e fraudes — não estamos falando de um ajuste contábil neutro. Estamos falando da transferência direta de recursos da população para sustentar estruturas que falharam em sua função essencial, ou seja, todos nós pagamos a conta.
E essa escolha tem custo: cada real destinado a tapar rombos em empresas públicas inviáveis e sucateadas é um real que deixa de financiar saúde, educação, segurança, infraestrutura e políticas sociais de verdade.
É menos investimento em hospitais, menos vagas em creches, menos policiamento, menos melhoria de estradas, menos programas que poderiam gerar mobilidade social.
Em outras palavras: quando o Tesouro cobre o buraco de uma estatal, quem paga a conta é o contribuinte — e o país sacrifica prioridades essenciais em nome de gestões públicas que não entregam o mínimo esperado.
6. 2026: O Ano da Tentação Populista
Ano eleitoral — e o histórico fala por si
O Partido dos Trabalhadores - PT - tem a tradição de ampliar benefícios sociais às vésperas de eleições — prática politicamente eficiente, mas fiscalmente destrutiva.
Com as contas desequilibradas e a popularidade volátil, o risco de “pacotes” pré-eleitorais cresce:
renovações de programas,
ampliação de transferências de renda,
subsídios temporários,
benefícios setoriais.
Entretanto, sem espaço fiscal, tais medidas só poderiam ser financiadas por aumento da dívida pública — e isso significa, sem rodeios, empurrar a conta para o futuro. A princípio, pode soar inofensivo: em vez de cortar gastos ou priorizar o que é essencial, emite-se mais títulos públicos e segue-se adiante. Mas a realidade é bem menos gentil.
Ao recorrer à dívida como muleta permanente, o Estado cria um ciclo perverso:
O endividamento cresce mais rápido que a capacidade do país de pagar - A trajetória da dívida deixa de ser sustentável, o que acende alertas em investidores, agências de risco e, inevitavelmente, no mercado de crédito. O país passa a ser visto como um devedor menos confiável.
O custo dessa dívida aumenta - Para convencer investidores a financiar o governo — que passa a carregar mais risco — é preciso pagar juros mais altos. E esses juros são pagos, novamente, com dinheiro público. Ou seja: mais despesas obrigatórias, menos espaço para investimentos.
A dívida de hoje vira inflação amanhã - Quando a percepção de risco sobe, o câmbio reage, os preços se espalham pela economia e o Banco Central é forçado a manter ou elevar juros. O custo de capital sobe, o crédito encarece, o investimento murcha. Crescimento? Fica para depois.
O País compromete o próprio futuro. - Dívida financiando despesa corrente é como usar o limite do cartão para pagar contas de água e luz: funciona no curto prazo, mas destrói o orçamento no longo. As próximas gerações passam a herdar um Estado pesado, caro, ineficiente — e com poucas margens para corrigir suas próprias crises.
Em última instância, financiar medidas sem espaço fiscal não é apenas questão contábil, é hipotecar o futuro para manter um presente artificialmente estável.
E, como a experiência brasileira já ensinou inúmeras vezes, quando a conta chega — e ela sempre chega — o ajuste tende a ser mais doloroso, mais abrupto e mais desigual.
Copa do Mundo: economia parada em dias de jogo
Um outro fator, não menos relevante no caso brasileiro, em 2026 teremos um grande evento esportivo a Copa do Mundo, eventos esportivos desse porte historicamente geram:
dias de paralisação,
queda de produtividade,
redução de atividade em setores não ligados ao evento.
No Brasil, isso tende a ser amplificado: politização, mobilizações, feriados informais e uso eleitoral do evento.
Guerra tarifária Brasil–EUA: o vento externo soprou contra
Tarifas americanas sobre produtos brasileiros — algumas chegando a 50% — têm potencial de reduzir exportações em até US$ 3 bilhões ao ano, e necessitam de negociação séria e técnica, pois tais tarifas pressionam diretamente:
agro,
indústria,
câmbio.
Com menos dólares entrando, o real se desvaloriza, a inflação sobe e o Banco Central ganha ainda menos espaço para reduzir juros, como esse tema ainda se arrasta ao longo de dezembro, provavelmente entraremos em 2026 com tais tarifas pressionando nossas contas externas.
7. Cenários para 2026–2027: Do “melhor possível” ao “provável ruim”
Cenário Otimista (15% –20%) — Realismo responsável
governo reestrutura estatais,
reduz déficit,
reduz despesas,
adota disciplina fiscal mínima,
negocia alívio tarifário com os EUA,
Banco Central ganha fôlego para cortar juros,
PIB cresce 1,5% a 2,5%.
É desejável — mas depende de escolhas que o governo já deveria ter feito e provavelmente não fará, principalmente em ano de eleição.
Cenário Realista (30% –35%) — O país que anda sem sair do lugar
manutenção da política fiscal frouxa,
Banco Central reduz juros, mas de forma tímida e lenta lenta,
investimento privado segue tímido e incapaz de suprir as necessidades do país,
estatais continuam deficitárias, porém contidas,
ausência de investimento de longo prazo;
PIB oscila entre 0,8% e 1,5%.
O Brasil vivendo seu eterno “quase”, o famoso “voo de galinha”.
Cenário Pessimista (45% –50%) — A armadilha fiscal se fecha
aumento do déficit das estatais,
gastos pré-eleitorais agressivos,
tarifas americanas persistentes,
câmbio depreciado,
inflação pressionada,
juros impedidos de cair,
PIB entre –0,5% e +0,5%,
risco de recessão técnica,
deterioração social e fiscal.
Este, infelizmente e lamentavelmente é o cenário que melhor dialoga com o conjunto real de incentivos políticos e decisões tomadas pelo governo.
Não se trata de pessimismo gratuito, mas de uma constatação objetiva: quando o ambiente institucional premia expansão de gastos, tolera déficits persistentes, posterga reformas estruturais e transforma austeridade fiscal em tabu político, o desfecho lógico não é um ciclo virtuoso — é justamente o contrário.
Dadas essas condições, insistir em um cenário otimista seria quase um exercício de ficção. O que é mais provável — e intelectualmente honesto reconhecer — é que o país continue preso a esse padrão disfuncional: crescimento anêmico, inflação resistente, dívida em trajetória ascendente e um Estado que consome mais do que entrega.
Em outras palavras, não é o cenário pessimista que é extremo — é a realidade que está nos empurrando para ele.
8. Conclusão — 2026 e o Realismo Cru de um País Que Insiste em se Sabotar
O Brasil encerra 2025 estagnado, endividado e sem qualquer clareza estratégica sobre o próprio futuro. A economia não tropeça por acaso — tropeça porque foi conduzida por escolhas duvidosas, guiada mais por voluntarismo político do que por racionalidade técnica.
O país vive um arranjo econômico que parece ter sido desenhado para falhar: expansão de gastos sem disciplina, estatais que drenam recursos públicos, guerra tarifária conduzida de forma improvisada, juros mantidos altos por necessidade e um governo cada vez mais preso ao próprio populismo.
Não há, hoje, sinais concretos de que a direção vá mudar. A máquina pública cresce, de forma ordenada, entrega pouco e sem fôlego para gerar investimentos, já o setor privado encolhe, sufocado pelo custo de capital e pela insegurança regulatória; e o governo se coloca como protagonista de tudo, menos do que realmente importa: eficiência, previsibilidade e responsabilidade, é grande demais e ineficaz demais.
A narrativa oficial fala em desenvolvimento, inclusão e fortalecimento do Estado — mas a prática revela uma administração arrogante, opaca e descolada da realidade fiscal.
O país insiste em repetir a mesma fórmula de baixo desempenho econômico:
um Estado gordo, arrogante, caro e ineficiente,
um setor privado estrangulado por impostos, burocracia e juros proibitivos,
gastos públicos crescentes sem contrapartida,
um ambiente institucional imprevisível,
e um crescimento que mal cobre o próprio aumento da população,
Se 2026 mantiver essa trilha — e, pelo andar da carruagem, tudo indica que manterá — o Brasil não deverá enfrentar uma crise súbita, daquelas que explodem manchetes. O cenário é mais sutil e, de certo modo, mais perverso: “um processo lento de empobrecimento coletivo”, no qual o país se acostuma a crescer pouco, investir pouco e esperar menos. Trata-se de um encolhimento silencioso, em que o potencial de desenvolvimento se esvai dia após dia, enquanto governos insistem em priorizar o curto prazo eleitoral acima de qualquer lógica de longo prazo.
O verdadeiro risco não é um colapso dramático das contas públicas — é algo mais difuso e corrosivo: uma implosão gradual da capacidade do país de gerar prosperidade. E este risco, diferente de uma crise abrupta, não acorda ninguém com sobressaltos. Ele se instala devagar, normaliza a mediocridade e cria uma espécie de anestesia econômica: a sociedade se habitua ao pouco, o governo se satisfaz com pouco, e o país entrega pouco.
Para quem observa o cenário com ceticismo informado, fica a constatação inevitável, o Brasil não está condenado pela natureza — está sendo condenado pelas escolhas que faz.
E, enquanto não houver vontade política para inverter essa lógica, continuará sendo o próprio algoz do seu futuro.
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